Queimadas
Que louco seria se as maiores plantações de cannabis no país fossem queimadas ao mesmo tempo, e uma grande fumaça viajasse pelo país, entorpecendo toda a população…
Parêmias nem tão pequenas, nem tão profundas, sobre a sociedade capitalista
Que louco seria se as maiores plantações de cannabis no país fossem queimadas ao mesmo tempo, e uma grande fumaça viajasse pelo país, entorpecendo toda a população…
Ousar sonhar
Ousar viver
é preciso se organizar
pra no coletivo debater
e o sonho transformar
em realidade a viver
Nunca perder a razão. Estamos cercados, cansados, famintos, feridos. Eles têm armas, treinamento e apoio. Somos uma massa organizada, somos os que criamos riqueza, somos o futuro que está nascendo. Observar, notar os pontos de falha e, unidos, em uma só força revolucionária, esmagá-los impiedosamente.
Lembro de títulos e autores, de sentimentos em mim despertados. Há imagens que persistem em minha memória, tão sólidas, tão profundas, e ao mesmo tempo nada nítidas. Mais os sentimentos do que as imagens. Mas sou incapaz de discorrer sobre essas obras. Nada, há uma tempestade infinita em minha cabeça, e é essa tempestade e essa incapacidade que me fazem não ter paciência com detalhes, com demoradas descrições. Quando não estou só, quero a essência.
Tudo vazio. As poucas pessoas que encontro estão com mais medo. Ah, que vida lazarenta! Quando eu tinha casa, família e trabalho, era uma alegria, mesmo com as dificuldades. Comer, só amanhã. É a merda de um feriado.
Raúl Antonio Capote Fernández e seu livro, foto de Katia Marko para o Brasil de Fato/RS: https://www.brasildefators.com.br/2023/10/13/ex-agente-duplo-o-cubano-raul-antonio-capote-fernandez-vai-lancar-livro-em-porto-alegre
Um dos esforços da Revolução Cubana é a infiltração em organizações e atividades contra revolucionárias de todos os tipos. Desde os francamente terroristas, passando pelos culturais, passando pelos políticos, passando por agentes infiltrados, passando por ações internas ou externas.
Capote é um professor universitário renomado, escritor, amado por seus alunos, ligado às mais diversas áreas da cultura, defensor da revolução, crítico de desvios e sectarismos. E discretíssimo agente do serviço de segurança interno do estado cubano.
Não temos em mãos um manual de contraespionagem. Temos algumas passagens de sua aventura por essa, como ele deixa claro, dolorosa experiência.
Experiência de quem teve que conspirar com o inimigo. Não os terroristas ou panfletários locais, ou mafiosos de Miami. Mas diretamente com as cúpulas diplomáticas do Império. Recebeu os equipamentos de última geração para estabelecimento de comunicações via satélite.
Foi testado à exaustão pelo inimigo, inimigo esse experiente em destruir as experiências socialistas europeias e levantes latino-americanos.
O foco: a juventude. A esse professor, tão ligado à juventude, a essa revolução, tão ligada à juventude, o inimigo propôs essa tarefa. E ele teve que engolir a seco até o dia em que lhe foi permitido revelar a seu bravo povo, em rede de televisão aberta, todos os planos em que participou.
Mais uma vez, o império falhou.
O Livro:
CAPOTE, Raúl Antonio. Inimigo: A guerra da CIA contra a juventude cubana. Rio de Janeiro: Consequência Editora, 2023. 232 p.
A política, por parte da burguesia, depende de ações armadas, ideológicas, econômicas. E a política mediando o controlável, e coordenando os objetivos.
Uma manifestação em Curitiba, há muitos e muitos anos marcou-me muito, não pela repressão, mas pela preparação da repressão. Não lembro quem era o governador, ou qual a questão. Eu tinha anotações detalhadas da situação, especialmente em relação ao aparato militar ali presente, mas de mudança em mudança, perdi o manuscrito (se alguém tiver uma cópia, por favor, me chama). Mas eram tempos de luta contra a ALCA e privatizações, e por melhores condições de trabalho para os funcionários públicos estaduais. MST e APP Sindicato estavam extremamente atuantes.
Tinha muita polícia. Tanta polícia que todos e todas da escola de formação da PM estavam lá. E a pressão apenas da multidão que estava em frente ao palácio do governo estadual, fazia com que víssemos a maioria dos PMs em treinamento chorando, mantendo sua posição como carne de terceira a ser descartada, se algo desse errado.
Atrás das colunas de soldados, transmissão ao vivo da manifestação que estava prestes a ser dispersada a sangue, pela afiliada local da Globo, a terrível RPC (Rede Paranaense de Comunicação), controladora do jornal Gazeta do Povo, àquela época, impresso, e um jornal de verdade, embora já com suas conhecidas tendências.
Perto do Governo Estadual estão os prédios da Assembleia Legislativa e Justiça Estadual. Muito gramado, área de estacionamento entre as construções, e uma grande praça à entrada principal.
Em frente à assembleia, estava eu encostado e à sombra com a companheirada :). Muito discretamente, uma coluna de soldados da PM veio esgueirando-se e tomou posição entre as pessoas e a grade.
Desalojado da sombra, resolvi explorar o terreno da operação. Dei uma volta pela fileira dos PMs em formação e cheguei aos fundos do palácio do governo. Entrei em um jardim lateral, por uma escada e me deparei com policiais guiando cães e com armamento pesado. Fiquei observando e não se ligaram na minha presença.
Desci e fiz o contorno da outra lateral pra chegar novamente à entrada principal. Dei de cara com todos os grupamentos especiais da polícia, civil e militar. Estavam em uma espécie de concentração, aguardando ordens.
E aí o mais interessante: o assunto era que “essas pessoas estão aí pra uma coisa justa”, que iria beneficiá-los também. Nesse tempo, as esposas de cabos e soldados eram muito ativas na denúncia e agitação das reivindicações de seus esposos, participando inclusive, em algumas manifestações com faixas e intervenções nos carros de som.
Também era recente o movimento de PMs em Santa Catarina, em que poucos comunistas estavam no efetivo e levantavam pautas importantes dos soldados, num movimento que quase resultou em greve.
Nessa manifestação (em que não houve confronto, apesar da gigantesca preparação militar para que tal ocorresse), consolidou-se em mim a necessidade de direcionar palavras de ordem aos agentes da repressão, ao invés de apenas xingá-los.
Em outra manifestação, ainda no “Centro Cívico”, na dispersão, as ruas não estavam liberadas para carro ainda, um camarada estava caminhando para ir embora, tranquilo, e a última coisa que ele escutou foi “é esse aí”. O camarada foi cercado por um grupo de policiais militares e espancado, até o ponto de ficar largado no chão com traumatismo craniano. Ação rápida e direcionada, e eu arriscaria, planejada. Foram alguns meses de agonia para todos nós e sua família, até a recuperação.
Na luta contra a privatização da SABESP, na cidade de São Paulo, militantes da UP/PCR são espancados, e três são presos. Dessa vez, a manifestação segue com palavras de ordem dentro da assembleia, mas do nada, vê-se uma coluna de PMs passando ao lado dos manifestantes e posicionando-se do outro lado de uma proteção entre o plenário e o espaço ocupado pelos manifestantes.
Corta! Num movimento muito rápido, os policiais estão em formação, de frente para os manifestantes, sem qualquer separação. Começam a espancar os mais próximos, causando a confusão necessária para construir uma base jurídica para os atos seguintes de lawfare, e tentar justificar a repressão.
Precisamos estar preparados, não podemos mais nos deixar ser pegos por essas ações assertivas e precisas da repressão. Elas são fruto de um longo acúmulo e treinamento, e devemos também estudar e treinar para não apanhar e garantir as ações que nos propomos.
A máquina militar burguesa, além da repressão direta a greves e protestos, tem seus treinamentos nas periferias das grandes cidades. Veja-se o que o governador Tarcísio está promovendo na baixada santista. É mais um laboratório para grandes ações de incursão, captura e execução.
Basicamente, esquadrões da morte formados exclusivamente por pessoal concursado e fardado.
Uma aflição se abateu sobre mim, em relação à China. À pergunta “A China é socialista?”, entrei com os dois pés dizendo que sim. (sem contar suas variantes sobre capitalismo de estado ou imperialismo). Mas fiz isso, principalmente, por levar em conta o fator humano. O debate é sempre muito abstrato. Essa tal China, o que é? Esquecemo-nos das pessoas, dos trabalhadores, do povo chinês.
Alguns podem argumentar que o debate não é sobre pessoas, é sobre um sistema socioeconômico para conduzir uma sociedade... Mas no fundo, o que é tudo isso senão pessoas em ação?
Escrevi um texto sobre o assunto, tentando ir por essa perspectiva:
https://bolha.blog/paulohrpinheiro/sobre-a-china
Temos o mais importante fato: aproximadamente 20% da população mundial vive em países autodeclarados socialistas, sendo a maioria na China:
País População Percentual
Mundial 7.900.000.000 100,00%
China 1.426.391.281 18,06%
Coreia Popular 25.778.816 0,33%
Cuba 11.326.616 0,14%
Laos 7.275.560 0,09%
Vietnã 97.338.579 1,23%
Países Socialistas 1.568.110.852 19,85%
O problema está na questão: “A China é ou não socialista”! Ser ou não ser, os universais positivo e negativo da lógica aristotélica: aqui está um gigante problema, para nos firmarmos como marxistas-leninistas, abandonamos a dialética.
Não tenho um conhecimento aprofundado, detalhado, sobre os processos sociais e econômicas na China, nem de toda a teoria envolvida (anotação: resolver isso). Tenho leituras desorganizadas e superficiais. Mas acompanho os grandes debates e fico sempre com essa pulga atrás da orelha: essa gente bate boca, mas parece estar seguindo caminhos que jamais levarão a um bom entendimento.
Desdobrando essa questão inicial, há ainda outra armadilha: tentar definir (como um teorema ou ainda, como axioma) o que é Socialismo. Isso me causa maior desespero, pois penso Socialismo como processo. Temos muitas experiências, no século 20, e essas poucas que ainda se mantém. E a realidade é que, iniciado o processo revolucionário, não há como tratar formalmente os problemas. A concretude do processo torce e espreme nossos textos clássicos preferidos, quase sempre não encontrando a ajuda ou respostas desejadas.
Antes, essa cultura deve nos preparar e equipar para avançar e não ser apenas um amuleto. Como o músico e o repentista que improvisa, devemos ter nossos dicionários de rimas e fraseados, para com maestria, improvisar, e não apenas reproduzir.
E eu também me perdi nessa.
Primeiro, permitam-me lembrar uma fala do Velho Prestes sobre Socialismo Real e a intelectualidade:
“O mal do intelectual brasileiro, é que ele idealiza o socialismo, um socialismo tirado da cartola dele, e como esse socialismo não coincide com o socialismo real, ele então combate o socialismo real.” (https://www.youtube.com/watch?v=QT4sZb2ESyc).
Estudar, informar-se, manter-se lúcido frente as contraditórias posições em relação ao tema. Não devemos temer nem o debate nem a contradição. Respirar e voltar aos clássicos. Estudar o que de aparentemente sério se fala, procurar informações autóctones sobre cada experiência. Estabelecer vínculos com as organizações e pessoas dessas nações.
Então, não tenho problemas em manter-me pensando que os trabalhadores chineses vivem uma baita contradição, mas que estão muito à frente com o PCCh e as grandes transformações, e o fim da pobreza absoluta, num tortuoso e, sim, vitorioso caminhar.
Sobre um olhar para as pessoas chinesas, não consigo me ver ignorando esses trabalhadores em suas vidas, em suas lutas. É algo que não se leva em conta, no debate, que o colocar uma etiqueta no processo chinês, de que seja apenas “revisionista”, “traidor”, ou “imperialista”, tenho o compromisso, como proletário revolucionário.
As duras lutas do século XX, libertaram e vem libertando os trabalhadores chineses, não sem contradições. No fim, penso que socialismo é isso: o caminhar de multidões rumo ao comunismo, com o protagonismo do proletariado e seus aliados, sem imposições idealistas que possam reduzir essa magnífica caminhada.
Ousar sonhar
Ousar viver
é preciso se organizar
pra no coletivo debater
e o sonho transformar
em realidade a viver
Do lado direito do ringue, a Rota, típica cidadã, zelosa de seus direitos. Do outro lado a Esfarrapada, funcionária pública, cumpridora de seus deveres. Irão se enfrentar mais à frente, mas pertencem à mesma categoria de gente: duas imbecis pequeno-burguesas.
Um “Psiu!” grunhido pela Rota, tem como resposta um “Quê?”, devolvido pela Esfarrapada. A Rota cidadã exige que a Esfarrapada servidora lhe traga uma revista de futilidades.
A Esfarrapada, num lento e silencioso movimento, levanta o braço e estica o dedo indicador (ufa!) em direção ao local dos periódicos. A Rota alega que não quer saber onde está, pois “Eu pago o seu salário!”. A Esfarrapada devolve um “Duvido que você pague imposto de renda; só quem paga pode dizer isso!”
As duas olham em volta, procurando aliados. Nós, insossos curitibanos, desviamos o olhar e acreditamos que nada está acontecendo, e o silêncio volta a reinar na biblioteca.