Sobre o documentário “Nossa Escola de Samba”
Já no começo, muito rapidamente, vemos o poder em vigorosa opressão, por exemplo, quando o senhor que está assistindo ao desfile é hostilizado por um policial, e, especialmente, a banca de jurados burguesa, branca. Tudo rápido, sutil, mas registrado.
Isso já nos abre uma percepção de que estamos num documentário muito além do registro das atividades e do cotidiano. Nos abre atenção aos detalhes, que nos abrem a uma percepção crítica.
O narrador profissional, interpretando o depoimento de um dos fundadores da escola de samba, Antônio Fernandes da Silveira, o China, me pareceu passar uma maior dinamicidade à obra, que não acredito seria alcançada pela simples intercalação de imagens ou apenas da fala do Sr. China com as imagens selecionadas.
Somos apresentados não só à preparação do desfile, mas também a algumas passagens pessoais de integrantes da escola, em seus cotidianos.
Muito anos depois, é fantástica a atualidade do documentário, mesmo com o aparente controle das burguesias ilegais sobre o processo, sobre as escolas, o que vemos é uma espécie de equilíbrio militar de forças, impedindo uma real vitória de um dos lados.
Músicos, artistas plásticos, trabalhadores que se dedicam à construção do espetáculo, todos são um só corpo.
Mais uma vez, uma rápida passagem para nos chamar à reflexão: um negro em uma liteira carregada por brancos.
Por fim, uma diferença entre esse passado e o presente: se o morro era uma opção aos sem-casa, por conta de não precisarem pagar aluguel, hoje as milícias usufruem de seu provisório poder, encarecendo e dificultando mais a vida de nosso povo.
E do nada, temos uma música do espetáculo Opinião, que subverte o tom de “normalidade” desse documentário. E assim, apresentando o que pode ser tomado como apenas um documentário bem feito, clássico, “normal”, as sementes de um olhar crítico estão espalhadas por toda a obra.
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