Fure a bolha

ciencia

#ciencia #jornalismo #historia

Fontes confiáveis

Introdução

Na ciência da computação dizemos em inglês garbage in, garbage out – se a entrada é lixo, a saída é lixo. Isso vale também para argumentação lógica e aprendizado. Conclusões verdadeiras exigem não apenas um método válido mas também fontes confiáveis. Podemos aplicar metaforicamente o ditado “você é o que você come”.

Critério 1: fidelidade a fatos (literatura científica)

Para qualidade de fonte jornalística ou histórica, um critério crucial é fidelidade aos fatos, respeito ao consenso da literatura científica e uso de bons métodos e boas fontes. Isso importa mais que o tamanho e o prestígio do veículo.

Muito me inspira o argumento de Santo Agostinho – um dos maiores doutores da Igreja. Ele, da época do Império Romano, já defendia que os cristãos se informassem bem sobre a ciência secular. Argumentava (parafraseando): quando um infiel ouve um cristão dizer asneiras e barbaridades sobre coisas visíveis, a Igreja perde credibilidade. De fato, quem diz barbaridades até sobre coisas visíveis não tem credibilidade nem para coisas visíveis, nem (muito menos) para coisas invisíveis.

Isso me serve de valiosa analogia para fontes jornalísticas e históricas. Meu ponto forte são as exatas, pois sou formado em engenharia eletrônica e ciência da computação. Penso que as ciências humanas e sociais são mais sutis e mais suscetíveis a controvérsia do que as ciências exatas. Então quem diz asneiras e barbaridades até sobre as exatas, que dirá das humanas? Quando a cegueira ideológica não poupa nem as exatas, aquela fonte não é confiável nem para exatas, e muito menos para humanas e sociais.

Por exemplo, quem nega a ciência climática perde a credibilidade.

Critério 2: autoridade

Normalmente, quem consulta um cardiologista renomado não exige as fontes (artigo científico, livro etc) quando ele diagnostica pressão alta. Da mesmo forma, um especialista em determinado assunto fala com autoridade sobre aquele assunto. Já um anônimo tem necessidade reforçada de mostrar boas fontes para suas principais alegações controversas. Das fontes sugeridas abaixo, o sítio Red Sails é pouco conhecido mas ainda assim é confiável, pois veicula artigos de autores bem formados ou cobertos de citações de boas fontes.

Critério 3: enquadramento

O enquadramento (ou framing) é uma arma poderosa. Vai além da factualidade e direciona a seleção, ênfase e apresentação de aspectos de uma realidade, promovendo uma definição particular do problema, uma interpretação causal, uma avaliação moral ou uma recomendação de conduta.

Não se trata apenas do que é noticiado, mas como. A escolha de palavras, a voz gramatical (ativa ou passiva), a atribuição (ou não) de autoria e a adjetivação criam um “quadro” mental que induz a interpretação do leitor. Um mesmo acontecimento pode ser enquadrado como “ataque brutal” ou “auto defesa”.

A seguir, contrastamos manchetes do jornal estadunidense The New York Times, ilustrando a diferença drástica de enquadramento conforme os interesses geopolíticos dos Estados Unidos.

Enquadramento desfavorável e atributivo

The New York Times: Russia Strikes Children’s Hospital in Deadly Barrage Across Ukraine

Russia Strikes Children’s Hospital in Deadly Barrage Across Ukraine

Para um adversário dos EUA, o jornal emprega técnicas para gerar condenação e imputar brutalidade a um responsável específico:

  • Identificação clara do agressor: “Russia Strikes” (“Rússia ataca”). As primeiras palavras da manchete explicitam o responsável pelo ataque.
  • Voz ativa: O emprego da voz ativa (”Russia Strikes”) ressalta a intenção. Apresenta o adversário dos EUA como um ator que escolheu a violência.
  • Linguagem emotiva e conotativa: “Deadly Barrage” (“ataque massivo mortal”). A palavra “barrage” enfatiza um volume massivo e indiscriminado de ataques, enquanto “deadly” enfatiza o custo humano.

Enquadramento favorável e dissociativo

The New York Times: Israel-Hamas War: At Least 25 Reported Killed in Strike on School Building in Southern Gaza

Israel-Hamas War: At Least 25 Reported Killed in Strike on School Building in Southern Gaza

Em contraste gritante, o jornal enquadra o ataque israelense a uma escola palestina empregando técnicas para diluir a responsabilidade e contextualizar o ato de forma favorável:

  • Contextualização que justifica: “Israel-Hamas War” (guerra entre Israel e Hamas). A manchete insere o evento no contexto amplo de uma “guerra”. Isto, por um lado, informa, mas por outro, insinua a normalidade do acontecimento, como se fosse um resultado esperado e inevitável da guerra.
  • Voz passiva e agente oculto: “At Least 25 Reported Killed” (“pelo menos 25 mortos são reportados”). A voz passiva omite o autor do ato. As vítimas (“25”) tornam-se o sujeito gramatical da frase, enquanto o ator das mortes desaparece do texto.
  • Dissociação do agressor: A manchete omite Israel como o autor do ataque. O leitor desatento pode, inclusive, inferir que possa ter sido o Hamas. O jornal descreve o ataque como um evento fortuito.
  • Linguagem técnica e impessoal: “Strike on School Building” (Ataque a Edifício Escolar). Comparado com “Strikes a Children's Hospital in Deadly Barrage”, a linguagem é mais fria e burocrática, minimizando a carga emocional.

Impacto do enquadramento

Os veículos jornalísticos sistematicamente enquadram acontecimentos conforme sua visão de mundo e seus interesses. A cobertura jornalística pode, por meio de escolhas conscientes ou inconscientes, orientar a percepção do público:

  • No primeiro exemplo, o veículo induz o leitor a condenar um agressor claramente identificado por um ato de brutalidade.
  • No outro exemplo, o veículo induz o leitor a registrar um evento trágico, mas sem um agressor claro, num contexto de “guerra” que atenua a responsabilidade.

Reconhecer esses mecanismos é vital para uma leitura crítica da mídia. A honestidade de um veículo vai além da factualidade, mas alcança o enquadramento da realidade:

  • Quem é apresentado como agente de ação e quem é apresentado como sujeito passivo?
  • O que é omitido? O que é enfatizado?
  • Que palavras são escolhidas para influenciar minha percepção?

Sugestões

Abaixo vão algumas sugestões de comunicadores e veículos que respeitam a ciência e, transparentemente, se posicionam à esquerda.

Língua portuguesa

  1. Opera Mundi
  2. Elias Jabbour – Presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos. Professor Associado da Faculdade de Ciências Econômicas, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais na UERJ. Em 2023–2024 foi Consultor Sênior da Presidência do Banco do BRICS e, de abril de 2006 a fevereiro de 2007, Assessor Econômico da Presidência da Câmara dos Deputados. Graduado em Geografia (1997), Doutor (2010) e Mestre (2005) em Geografia Humana pela USP. Tem experiência em Geografia e Economia com ênfase em Geografia Humana e Econômica, Economia Política, Economia Política Internacional e Planejamento Econômico. Atua principalmente nos temas: China; Socialismo com Características Chinesas; Nova Economia do Projetamento; Categorias de Transição ao Socialismo; Estratégias e Experiências Nacionais e Comparadas de Desenvolvimento; Categoria Marxista de Formação Econômico-Social; e Pensamento Independente de Ignacio Rangel. Vencedor do Special Book Award of China.
  3. José Kobori, importante financista de esquerda
  4. ICL Notícias
  5. Carta Capital

Língua inglesa

  1. Geopolitical Economy Report
  2. Red Sails

#ciencia #aquecimentoglobal

https://daily.jstor.org/how-19th-century-scientists-predicted-global-warming/

Em 1856, a proeminente feminista e cientista amadora Eunice Newton Foote publicou os resultados de seus experimentos demonstrando que CO₂ e vapor de água capturam calor e previu que uma atmosfera de CO₂ levaria a um planeta mais quente.

Em 1896 o físico sueco Svante Arrhenius construiu o primeiro modelo climático e calculou corretamente que, se a concentração de CO₂ dobrasse, a temperatura mundial aumentaria entre 5 e 6ºC.

Ao longo de quase 170 anos desde Eunice, a ciência desenvolveu modelos teóricos matemáticos e computacionais e os comprovou com um oceano de evidências empíricas de diversas categorias. Anéis do tronco de árvores antigas revelam a intensidade dos invernos ao longo da vida da árvore. Bolhas de ar aprisionados em colunas de gelo revelam a composição histórica da atmosfera. E temos abundância de dados diretos de termômetros, estações meteorológicas e satélites.

Mas segundo os negacionistas, tudo isso seria um complô dos incontáveis cientistas e especialistas de inúmeras instituições públicas e privadas (com fins lucrativos ou não), seculares e confessionais (como as PUC), de inúmeros países com muitas línguas, religiões, culturas e sistemas políticos, todos conspirando há quase 170 anos para prejudicar o capitalismo.