Sobre a China
Publicado originalmente em Em Defesa do Comunismo/sobre-a-china/
Se há um tema quente entre comunistas, é a China. Não precisamos, não podemos, e não devemos estagnar num estado em que apenas colocamos pomposas etiquetas para encobrir o não conhecimento pormenorizado das sociedades analisadas. Aqui vai um contexto inicial, para marcar o terreno em que estamos entrando:
País População Percentual
Mundial 7.900.000.000 100,00%
China 1.426.391.281 18,06%
Coreia Popular 25.778.816 0,33%
Cuba 11.326.616 0,14%
Laos 7.275.560 0,09%
Vietnã 97.338.579 1,23%
Países Socialistas 1.568.110.852 19,85%
Temos aproximadamente (os dados de cada país referem-se a censos em diferentes anos, mas o que importa aqui são as ordens de grandeza, e não números exatos), 20% da população mundial vivendo sua jornada socialista, representados em sua quase totalidade pela China, lembrando que os demais países citados também se apresentam com grandes contingentes populacionais.
O socialismo é uma experiência viva, com todas as suas dificuldades e problemas, ocorrendo em pleno século XXI. Não é algo que foi varrido do mapa mundial com a queda da experiência soviética, embora as consequências dessa derrota sejam inegáveis e vividas por todos nós, cada vez mais.
O que me incomoda nos debates sobre os caminhos chineses é, primeiro e mais grave, ignorar ou diminuir a ação dos trabalhadores chineses. Ou glorifica-se o governo chinês (em raros casos especificamente o PCCh), ou então cai-se na simplificação de aplicar alguma etiqueta, como “capitalista”, “imperialista”, “traidora”, “revisionista”, “degenerada”, e tantas outras à experiência nacional como um todo. Em muitos casos, com nem sempre discretos tons de sinofobia.
Esses povos que se mantém ainda sob a égide socialista, nos ensinam vários caminhos, e devem nos levar a uma pesquisa madura sobre sua história, especialmente a contemporânea.
À exceção da Coreia Popular (que além de suas próprias forças, conta com o apoio chinês), percebe-se a presença e estímulo da atividade capitalista, seja formal, seja informal nos outros países. Nesse sentido, penso que a China é o grande palco da burguesia formal, com suas articulações internacionais, inclusive com operações em outros países. Em outro extremo, Cuba é assolada por uma multiplicidade atividades econômicas, seja pelos pequenos empreendimentos individuais voltados ao turismo (em que gorjetas e valores ganhos em um dia são múltiplas vezes superiores ao salário mensal de um trabalhador), seja pelo contrabando e mercado paralelo, além das atividades de maior vulto, formalizadas em geral, via aporte estrangeiro. Já Laos e Vietnã contam com aberturas profundas ao dito “livre-mercado”.
Tudo isso por si só já é complicado. Então, para dar mais um passo, vejamos algumas atuações internacionais. Na atual movimentação para uma nova guerra imperialista de alcance mundial e com reais chances de extermínio direto da humanidade, ou das condições necessárias para a nova sobrevivência, vemos uma intensa movimentação para reiterar a amizade com o povo russo, especialmente por parte de Cuba e China.
África e América Latina sendo tomados por capitais chineses, ainda que sem o caráter imperialista. Temos Cuba se declarando publicamente amiga do PSUV (https://pt.granma.cu/cuba/2023-08-10/o-pcc-e-o-psuv-estarao-sempre-no-mesmo-caminho-da-revolucao) ao mesmo tempo em que este já lutava abertamente para tomar o controle do PCV (https://diariodecuba.com/internacional/1692108912_49163.html).
Só trago esse caso particular para ilustrar que para além das políticas internas, as ações e relações exteriores dos governos e partidos revolucionários desses povos nem sempre serão aceitáveis. Devemos buscar um posicionamento sobre a China. Apenas reitero que isso não deve se resumir à escolha de qual etiqueta colocar no mapa da China.
Mesmo entre nós há uma prevalência de informações oriundas dos grupos privados de comunicação, cujo objetivo é desinformar. A pouca circulação de qualidade e minimamente confiável de informações sobre os países socialista ainda fica restrita às bolhas de internet. Nossa imprensa tem o dever histórico e internacionalista de divulgar o que ocorre nesses países, continuamente.
Nos casos de países que realizaram a conquista do poder político para o proletariado, o primeiro compromisso é com esses trabalhadores. A revolução socialista não significa que seja sempre possível varrer de imediato toda e qualquer relação capitalista. Pois ao simplesmente virar as costas para qualquer uma dessas experiências, o que se faz concretamente é virar as costas para o proletariado desse país.
Por isso insisto que devemos aprofundar nosso conhecimento sobre esses países. Não podemos viver de fotografias dessas sociedades, mas antes, estabelecer um acompanhamento vivo e contínuo de tudo que ocorre, o que só pode ser feito com trabalho profissional e dedicado, seja com o estabelecimento de sucursais de nossa imprensa em cada um desses países, seja pela participação ativa em algum órgão que reúna partidos comunistas para esse fim, o que poderia até nos qualificar como uma agência de notícias sobre o mundo do socialismo aqui no Brasil, por exemplo, além de nossa necessidade interna de permanente informação, para que não sejamos pegos de surpresa em possíveis grandes eventos.
Sobre China, Cuba e Coréia Popular, temos um intenso e bem feito trabalho de divulgação em português desses países, já seria um bom começo acompanhar e sistematizar esse material:
O mesmo vale para países em que temos organizações revolucionárias “mais chegadas”.
Mas voltando à China, precisamos não cair na função de etiquetadores, devemos estabelecer relações próximas com seu povo e seu cotidiano, assim como todos os outros países socialistas. Mais uma vez, não podemos voltar as costas ao grande palco da luta de classes do nosso século, com suas terríveis e fascinantes contradições.