A cultura eleitoreira nas comunidades e a militância autônoma
Na militância autônoma somamos na luta de muitas comunidades. Muitas vezes a revolta contra uma injustiça faz com que a comunidade se vincule a um projeto maior de organização de base autônoma. Nestas comunidades nós não somamos, nós multiplicamos. Entretanto, há comunidades que apesar da mesma revolta, somos surpreendidos ao ver ela tornar, de repente, um rumo eleitoreiro, principalmente próximo às eleições. Parece que um eclipse surge sob aquela rebeldia e que de repente toda revolta contra o sistema que se exalava parece confusamente agora reproduzindo o que há de pior na política. Mas nenhum eclipse é eterno.
Olhamos nas pessoas, geralmente lideranças, com as quais partilhamos trincheiras e frequentemente se houve: “Camarada, é que tem que ter um da gente lá dentro”, “Com o nosso candidato vai ser diferente, é alguém da comunidade”, “Nós tamo junto na luta, mas a comunidade precisa de alguém para dar voz por ela lá”. Tal situação pode deixar o sentimento confuso para o militante. Será que foi em vão? Será que fui ingênuo? O que fiz de errado?
Eleições e a precisão do povo
O povo vive em contradição entre as suas ideias por que em parte elas derivam da sua realidade material enquanto classe, de sua precisão, e em outra parte derivam das ideias da classe dominantes. Afinal, a classe dominante não seria dominante se suas ideias não fossem também. Por isso a disputa das ideias é importante.
As eleições, por sua vez, são o método em que os exploradores tem para manter seu poder político sob os explorados. Como um redemoinho, ela acaba sugando as possibilidades de fazer política para o mesmo ponto: A manutenção da classe dominante. Inclusive suas raras facetas “progressistas” ou até “eleitoralmente radicais” são estratégicas para que se fortaleça a ilusão de liberdade dentro do sistema político. Contudo, o que domina permanece sendo a prática eleitoreira, ou fisiologista, como também pode ser chamada. Aquele poço de lama onde os princípios são os primeiros a morrer. Esta é a democracia burguesa.
Contraditoriamente, faz parte do senso comum a ideia de que político é ladrão. Isto não é um pensamento ingênuo. É um saber acumulado não somente de uma vida, mas de gerações e gerações de trabalhadores que presenciaram os mais diversos políticos assumirem os palanques, prometer, se vender e não cumprir o que dizia nas eleições.
Estas ideias habitam o interior do povo e suas contradições produzem os mais diversos resultados: apatia, oportunismo, tristeza e muita revolta. Talvez o mais doloroso seja falta de caminhos. Porém, para que o povo trilhe um caminho, é preciso que ele seja feito de sonho e de concreto.
O sonho e o concreto no sindicalismo revolucionário
O sindicalismo revolucionário acerta ao vincular a luta imediata com a luta política pela libertação integral do povo. Esta ponte é feita a partir das condições materiais do povo, é capaz de superar as ideias dominantes e trilhar o caminho para a revolução social. Voltamos, então, ao caminho. Quando disse que ele deve ser feito de sonho e de concreto, é que, como diz o apóstolo Paulo: “A fé sem obra é uma fé morta”.
O povo caminha para sua libertação, rompendo os grilhões eleitoreiros, através de sua conscientização. Contudo, é muito mais dificultoso se conscientizar com ideias sem exemplos reais, palpáveis, para poder se basear. A riqueza do militante está em mesmo se as obras completas conseguir cultivar a fé.
Ou seja, muitas vezes a comunidade pode até está convencida de que o sistema político é um jogo de cartas marcadas, mas não chega a se conscientizar ao ponto de se comprometer com um projeto para além das eleições. Assim, é comum que organizações novas, com pouca base, enfrentem estas situações. O importante é que a militância consiga sinalizar que para além deste jogo, pode a comunidade pode contar com a organização enquanto classe trabalhadora para os desafios que virão independente do resultado das eleições.
Ao mesmo tempo, é preciso não cair no voluntarismo, entendendo que se uma organização de base não constrói base, ela não tem força para se solidarizar com ninguém. A franqueza e a capacidade de enxergar além do eclipse é o que se deve cultivar para que os frutos da luta falem por si só.
Sabedoria do Povo é um projeto de produção de conteúdo formativo sobre sindicalismo revolucionário. Contato: sabedoriadopovo@protonmail.com Quem sabe este projeto solitário não vira algo maior.