O Mestre apertador de parafusos

Atualmente, trabalho remotamente com vários desenvolvedores em vários pontos do Brasil. É uma experiência muito rica pois, mesmo estando todos no Brasil, trato com pessoas com culturas, gírias e comportamentos distintos.

Todos são ótimos profissionais do ponto de vista técnico, mas muitas vezes um tanto inocentes em relação ao trato com o dinheiro e com o valor do próprio trabalho. Um dos pontos que mais me incomoda é quando peço uma tarefa e o desenvolvedor diz que não irá colocar aquela tarefa em sua planilha de horas por tê-la feito muito rápido.

E para eles gosto sempre de contar a fábula do “Mestre apertador de parafusos”:

Um navio chegou em um porto distante e estava com um problema no motor. Chamaram um mestre que trabalhava há muito tempo no porto para fazer o orçamento e ele cobrou 10.000,00 para consertar o motor.

Como era perigoso sair do porto com o problema no motor, o capitão do navio aceitou o orçamento, mas foi acompanhá-lo no serviço.

O sujeito entrou no navio, analisou o problema, pegou uma chave de fenda e apertou 2 parafusos. O motor na mesma hora passou a funcionar corretamente.

O capitão chegou e falou: você vai me cobrar 10.000 por ter apertado 2 parafusos???

O técnico então falou: não senhor! Para apertar os parafusos, eu cobro apenas R$1,00!! Estou cobrando 9,999,00 pelo meu conhecimento de saber QUAIS parafusos eu preciso apertar!!

Ou seja, temos que saber mensurar o valor correto do nosso trabalho, não só em termos de horas trabalhadas, mas também no valor que o trabalho representa em termos do conhecimento empregado. Muitas vezes, um atributo novo em um CSS agrega muito mais valor do que 100 linhas de código!

Enfim, fico sempre atento para nunca fazer o papel do capitão do navio que não reconhece o trabalho de quem está consertando o navio. O reconhecimento do trabalho de uma pessoa tem um valor inestimável principalmente quando o reconhecimento vem dos seus pares. É fundamental que o gestor ou coordenador de projetos fique sempre atento a essa questão.

Para completar: em meus 40 anos de experiência profissional, consegui identificar 3 tipos de capitães em relação ao reconhecimento de seus marujos: o atento, o distraído e o ganancioso. O atento é o que busca reconhecer os esforços de sua equipe e a retribui tanto em forma de elogios, mas também financeiramente. O ganancioso é o que sabe que sua equipe é boa, mas não a reconhece publicamente por inúmeros fatores espúrios.

Contudo, a maior parte deles se encaixa na categoria dos distraídos: estão tão entretidos em suas tarefas diárias que não conseguem perceber/divulgar o mérito de sua equipe. E dentro dessa categoria, tem muito capitão de navio que não reconhece o trabalho alheio por ignorância, ou seja, por não perceber que aquele trabalho tem um valor agregado que não se contabiliza no número de parafusos apertados.

Nestes casos, cabe ao mestre, ao artesão, ao técnico, nós, desenvolvedores de software, engenheiros, etc mostrar o valor de nosso trabalho. Passar a odiar o capitão não vai resolver o seu problema. Tente se colocar no lugar dele pois mutas vezes ele só está precisando que lhe abram os olhos!