Sobre leitura…
“A diferença entre a literatura e o jornalismo é que o jornalismo é ilegível e a literatura não é lida.” Oscar Wilde (dizem).
Minha mãe me ensinou a ler cedo, em casa. E depois que aprendi, ela me repreendia, dizendo que ficaria doido, porque minha atenção era só textos; eu mal olhava o caminho que seguia, apenas placas, postes, carros, camisas… lia absolutamente tudo, até papel catado no chão, e nessas horas, ela me brigava!
No início escolar, tive que esperar um ano em casa, porque meus colegas de turma ainda estavam aprendendo, e a professora não sabia o que fazer com uma criança já leitora, isolada no canto da sala.
Quando gostava de uma estória, relia tantas vezes que acabava memorizando. E algumas tias me pediam para recontar, enquanto elas acompanhavam no livro para ver se pulava alguma palavra. Eu lia certinho, e elas ficavam impressionadas!
Ler, para mim, é ver imagens no pensamento. A palavra salta do papel para a mente. Só adulto, descobri que isso não é tão natural, não para a maioria. De qualquer forma, ler é uma habilidade, e como tal, pode ser desenvolvida.
Existe uma cobrança muito forte sobre o ato de ler, uma obrigação. Na realidade, um disfarce para a distinção do livro, enquanto objeto de consumo intelectualizado, e a imagem idealizada da pessoa leitora, enquanto erudita.
Uma confusão entre erudição e inteligência (quantidade e qualidade), já que ler muito não é garantia de salto qualitativo e livro tem custos, pois produto de uma lógica que visa o lucro; as livrarias fechando são evidências dessa contradição.
Talvez por isso, o alarde sobre o fim da leitura e do livro. Mas enquanto houver pessoas, haverá leitura, ainda que não existam livros, porque “a leitura do mundo precede a leitura da palavra” (Paulo Freire). Não lemos apenas texto escrito, mas tudo que nos rodeia, desde sempre. As culturas de tradição oral são prova disso.
Um vídeo, uma música, um podcast, uma imagem, um meme, uma peça teatral, uma apresentação de dança, tudo é texto, ainda que numa modalidade diferente. Mais importante que ler apenas livros, é saber interpretar a realidade ao redor. Do que adiante ter doutorado e não dar “bom dia” ao porteiro?
O importante é ler, do jeito que se pode, tudo que se quer, sem se preocupar com as leituras alheias, pois cada um tem seu tempo e tipo de leitura. Melhor ainda se souber seus direitos (os imprescritíveis do leitor, propostos por Daniel Pennac em seu “Como um romance”):
- O direito de não ler.
- O direito de pular páginas.
- O direito de não terminar um livro.
- O direito de reler.
- O direito de ler qualquer coisa.
- O direito ao bovarismo, ou direito de se esvair da realidade.
- O direito de ler em qualquer lugar.
- O direito de ler frases soltas no livro.
- O direito de ler em voz alta.
- O direito de nos calar.
Não percebi na época, mas minha mãe também me ensinou a ler pessoas. Ela mesma foi meu primeiro “livro”.
Rascunhos de escrita, antes de publicação no sitezinho